
A morte de Jairo Carvalho no início desta noite está causando perplexidade em muita gente, pois ele foi vítima de um câncer que não lhe deu chance de sobrevivência. Tudo muito rápido. Jairo era professor e trabalhava no Núcleo de Educação a Distância da UEM. Ele escreveu um capítulo à parte na História: foi uma das principais figuras do movimento estudantil responsável pela ocupação da Reitoria da UEM em 1984, a partir da qual se fortaleceu uma luta cujo desfecho foi a conquista da gratuidade nas universidades públicas paranaenses. Jairo presidiu o DCE da instituição. Militante de primeira hora do PT, ajudou a fundar o diretório da sigla na cidade. Reproduzo abaixo a reportagem que fiz para a revista especial sobre os 50 anos da UEM publicada, em dezembro último, pela Editora Dia a Dia.
“32 anos de gratuidade
Processo que resultou no fim da cobrança estava inserida no contexto de outras lutas
Tão aplaudida à época, a conquista da gratuidade nas universidades estaduais paranaenses está fazendo 32 anos. O triunfo pelo fim da cobrança das mensalidades decorre de uma luta sem precedentes encampada pela sociedade em geral, com a participação decisiva das classes estudantil e docente universitária, tendo, ainda, o engajamento dos funcionários.
Os primeiros movimentos em defesa de uma universidade pública gratuita surgiram na segunda metade da década de 1970. Universidade esta criada na época do regime militar, num contexto político voltado para a ampliação do ensino pago.
Para além da questão da gratuidade, outras bandeiras eram empunhadas pelos agentes universitários e professores, como a conquista de salários mais dignos e melhores condições de trabalho.
Ao mesmo tempo, é fato que setores da classe média do País se movimentavam para pedir a expansão do ensino superior público e gratuito em todo o Brasil.
No dia 21 de dezembro de 1987, o então governador Álvaro Dias sancionou a lei estadual 8.675, prevendo a gratuidade. A regulamentação da lei, no entanto, ocorreu em 11 de janeiro de 1988, por meio do decreto 2.276. O assunto virou tema de pesquisa na academia. O professor Reginaldo Benedito Dias, do Departamento de História, num artigo escrito para ser um dos capítulos do livro “Paraná Insurgente”, organizado por Joseli Mendonça e Jhonatan Souza, sustenta que “a introdução da gratuidade ocorreu em fase avançada do processo de redemocratização do país e de democratização das universidades. Talvez não seja um fato suficientemente divulgado e sedimentado na memória coletiva que a Lei 8.675 traduziu uma negociação consignada no desfecho da greve sindical de 1987”.
Não conseguiam pagar
Dias também é autor do livro “Uma Universidade de Ponta Cabeça”, onde relata, em detalhes, todo o processo sobre a conquista da gratuidade. Ele foi estudante do curso de História da Universidade e membro da Coordenação Geral do DCE em 1985, além de ter participado diretamente, de 1983 a meados de 1987, dos movimentos que culminaram no fim da cobrança de mensalidades no ensino superior público.
Ex-presidente do DCE, Jairo de Carvalho, funcionário da UEM, lembra que quando estudou na instituição, de 1981 a 1986, os alunos pagavam o carnê equivalente ao semestre no qual estavam matriculados, além das outras taxas.
Em depoimento à Assessoria de Comunicação Social da universidade, em 2017, ele declarou que os estudantes “nem sempre conseguiam [pagar]. Quando isso ocorria, tinham que negociar o parcelamento das suas dívidas com o setor de finanças da instituição ou abandonar, provisória ou definitivamente, o seu curso”, diz.
Ainda conforme Carvalho, houve semestre em que um número próximo a quinhentos não tinham saudado seus débitos. Também era significativo o número de estudantes que dependiam das bolsas de estudos do governo federal repassadas por deputados, que fidelizavam alguns eleitores entre as pessoas que recebiam as bolsas e ficavam assim devendo favores aos políticos.
O DCE da UEM foi criado em 1980, na vanguarda da redemocratização do país, organizando os estudantes contra os aumentos e reajustes das mensalidades. “Estivemos nessas lutas como estudantes e chegamos à direção do Diretório Central dos Estudantes no final de 1982. Era a gestão “Outras Palavras”, liderada pelo companheiro Ademir Demarchi, que, logo de início, organizou a campanha de boicote às anuidades com o recolhimento dos carnês”.
Tendo vencido as eleições seguintes para a entidade, depois de um ano de lutas intensas, a gestão “Próximos Passos”, na qual Carvalho era o presidente, intensificou ainda mais as atividades pela gratuidade do ensino e contra o reajuste nas taxas.
“Em 1984, a dificuldade em negociar o congelamento do preço das refeições do Restaurante Universitário elevou o clima, culminando com a ocupação da reitoria e outras dependências da universidade pelos estudantes por vários dias, só retornando às aulas depois que o congelamento foi conquistado, com a ajuda do prefeito municipal, Said Ferreira”.